terça-feira, 10 de maio de 2011

Balance

Hoje, não apenas hoje, mas especialmente hoje, tenho dúvidas deste mundo. Hoje desarrumei a caixa. Hoje, cumulativamente, vasculharam joias, tesouros, segredos, soltos e escondidos entre artefactos nesta caixa.
O sangue percorre as veias como rindo, às gargalhadas. Em parte, nervoso miudinho. Por outro, pelas situações caricatas em que se colocam os demais, sem necessidade, sem pedido.

E não vou arrumar a caixa, hoje. Há dias em que precisamos deixar pendentes, por que vamos querer prolongar a conclusão dos mesmos em acto ponderado, decidido. E, no seu tempo, selarei o envelope.

domingo, 27 de março de 2011

Inspiração alheia

Há muito tempo que não escrevo. Como azeite para água. A escrita, em mim, tem um efeito condutor que pode, até, levar à separação de placas. Ao desajuste e ao caos. Deixo bilhetes escritos no vazio. Crio tormentas pelo silêncio de mil palavras. Volto ao labirinto de poder, tão dentro, na redoma. E rodopio para novamente escrever, na areia, na efémera e intermitente matéria movediça. Deixo bilhetes fora de caixa. Busca incessante de novas arrumações, novos desencontros também. Mexe e volta a mexer. Umas vezes em ebulição, outras em abaixamento criogénico. Palavras soltas, na essência de um grito.

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Got to go!

http://www.zarpa.eu/2010/10/23/casa-museu-medeiros-e-almeida/arte/dinky-toys-celebram-76-anos/

impulsos...

afinal é assim?

brilhante!

"Era uma vez antigamente, mas muito antigamente, nas profundas do passado, quando os bichos falavam, os cachorros eram amarrados com linguiça, alfaiates casavam com princesas e as crianças chegavam no bico das cegonhas. Hoje meninos e meninas já nascem sabendo tudo, aprendem no ventre materno, onde se fazem psicanalisar para escolher cada qual o complexo preferido, a angústia, a solidão a violência. Aconteceu naquele então uma história de amor."
In O Gato Malhado e a Andorinha Sinhá, Jorge Amado

será assim que publico música?

http://www.youtube.com/watch?v=_9UauaXTXUI

terça-feira, 26 de outubro de 2010

pérolas

A Pérola, de John Steinbeck… assim permaneceu no limbo de uma história simples. Manhãs sombrias de Outono, folhas encarnadas a sobrevoar o solo. Neste começo de inverno, cheiramos chocolate em cada esquina.
Atormentados pelo cinzento crepuscular, vivemos palpitações de um estádio oscilante, umas vezes amorfo, outras palpitante.
E sinto-me tão viva!
No percurso, a vida feita de pequenos detalhes, de mentes controversas, de pormenores intensos. Momentos apaixonantes e apaixonados que nos levam à distância. Todos temos um lado oculto? Sempre pouco térreo? Buscamos ideais, procuras insaciáveis do original, genuíno… ideal? Diria que na maioria das vezes encontramos continentes, conteúdos, essências apresentadas sob formas simples e simbólicas... Quase permeáveis ao sensorial.
Libertações de elfo… quase me arrisco, às vezes provocamos a levitação para não marcar o chão que pisamos. E se noutras queremos deixar pegada, hoje acordo a pisar leve…
Modificamos estados. A gastronomia molecular para nos trazer as texturas perfeitas dos sabores que conhecemos? É ciência, nem sempre bem conseguida. Falta integração, integridade, a nano relação com o sistema nervoso central!
Num percurso de missão, procuramos encontrar razão, sentido… rumo? Não se procura, encontra-se? Errado. Encontramos porque procuramos. Saímos diariamente despertos, na esperança de um dia diferente. Na esperança de ganho, de escaladas ou quedas livres, de tormentos ou raios de sol, de uma lua nova ou cheia, ou meio vazia, ou meio cheia. Entre pérolas criamos sonhos….

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Terra a terra...

Não podem cobrar a distância, o tempo sem escrever... Isto é um novo formato de partilha, de escrita... E nesse registo, às vezes permitam-me a instrospecção ou a falta de inspiração.
Não sei como dizer-te que minha voz te procurae a atenção começa a florir, quando sucede a noite
esplêndida e vasta.
Não sei o que dizer, quando longamente teus pulsos
se enchem de um brilho precioso
e estremeces como um pensamento chegado. Quando,
iniciado o campo, o centeio imaturo ondula tocado
pelo pressentir de um tempo distante,
e na terra crescida os homens entoam a vindima
— eu não sei como dizer-te que cem ideias,
dentro de mim, te procuram.
 
Quando as folhas da melancolia arrefecem com astros
ao lado do espaço
e o coração é uma semente inventada
em seu escuro fundo e em seu turbilhão de um dia,
tu arrebatas os caminhos da minha solidão
como se toda a casa ardesse pousada na noite.
— E então não sei o que dizer
junto à taça de pedra do teu tão jovem silêncio.
Quando as crianças acordam nas luas espantadas
que às vezes se despenham no meio do tempo
— não sei como dizer-te que a pureza,
dentro de mim, te procura.
 
Durante a primavera inteira aprendo
os trevos, a água sobrenatural, o leve e abstracto
correr do espaço —
e penso que vou dizer algo cheio de razão,
mas quando a sombra cai da curva sôfrega
dos meus lábios, sinto que me faltam
um girassol, uma pedra, uma ave — qualquer
coisa extraordinária.
Porque não sei como dizer-te sem milagres
que dentro de mim é o sol, o fruto,
a criança, a água, o deus, o leite, a mãe,
o amor,
que te procuram.


(excerto do poema «Tríptico», publicado em A Colher na Boca, 1961)                    
        Herberto Helder